segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Correr e comer...

... são duas palavras que se escrevem quase da mesma maneira. Acredito que não seja coincidência!
 
Nesse sentido, Évora é um local perfeito para se fazerem ambas! Não foi, portanto, surpresa que eu tenha ido fazer a Meia Maratona pelo quarto ano consecutivo, mantendo-me como totalista na prova. Em itálico, porque descobri recentemente que num dos anos fiz a prova com o dorsal de um colega de equipa que não pôde comparecer. Já nem me lembrava disso e foi um ligeiro balde de água fria. Sou totalista de forma oficiosa, mas por causa disto nunca serei de forma oficial. Fica aqui também a nota para juntar à discussão sobre participar em provas com dorsal alheio.

Confesso que, apesar de tudo, não estava com muita vontade em ir. Nenhuma razão em particular, circunstâncias da vida, talvez. Ou apenas parvoíce porque quando o despertador tocou às 6:00 não precisei de muito para saltar da cama e às 7:00 conforme combinado já estava o grupo todo reunido para arrancarmos. A viagem fez-se de forma tranquila e com chuva ligeira - o regresso foi com um temporal, mas não tão violento como o que apanhámos depois do Porto - que ainda caia quando chegámos ao estacionamento habitual. Os dorsais foram levantados de forma rápida e ficámos com bastante tempo para queimar que foi passado em amena cavaqueira num dos cafés próximos da partida. Cafézinho tomado, idas ao wc, tudo em ordem. Quase, porque da minha parte não ficou o serviço feito na totalidade, o que se veio a revelar muito incómodo a certa altura da prova.
 
Foi no café que percebi que a nossa enfermeira de serviço afinal não ia fazer a Meia Maratona, mas sim os 10km. Isso significava que desta vez eu seria o único elemento a fazer os 21km, dois fariam os 10km e o grosso do grupo estava presente na caminhada. Isso dava-me alguma pressão extra e azo a promessas de que se eu demorasse muito a terminar a malta ia pegar nos carros para irem andando para o restaurante e eu teria que ir a correr até lá. 'Tá bem... Também gosto muito de vocês!

Regresso aos carros para terminar de equipar, escolher os casacos certos para a chuva (que iria desaparecer antes do início da prova), tirar umas últimas fotos e lá fomos até aos pórticos de partida. E aqui tenho que fazer um comentário de algo que me incomodou e que parece ser cada vez mais habitual em provas. O speaker estava bastante animado e ia dando os agradecimentos finais nesta que foi a última prova do ano do circuito Running Wonders. Até aqui, tudo bem. Mas no momento em que disse que estavam presentes 6000 pessoas eu achei completamente descabido. Já vi que terminaram a Meia 604 atletas e os 10km 703 atletas. Aqui estão 1507 e garantidamente que não havia 4500 pessoas na caminhada. Também duvido muito que estivessem 6000 inscritos e que para aí metade não tenham aparecido. Este exagerar do número de participantes nas provas chateia-me. Desabafo feito.

Vamos é correr antes que chova! Os primeiros quilómetros no centro de Évora são complicados. As ruas estreitas, muita curva e contra-curva, empedrado, mais empedrado, sobe e desce. Um Urban Trail, ouvi eu de outro atleta. Senti foi menos atropelos e, mais importante, sentia-me bem pelo que fui andando a um ritmo agradável, mesmo quando se começa a subir pelo zona exterior das muralhas. Até achei que estava a ir demasiado depressa. Não sabia eu o furacão que aí vinha após o quarto quilómetro. Estou eu tranquilo nos meus pensamentos e a começar a ver que a malta da caminhada estava a começar a aparecer em sentido contrário quando alguém me dá o braço e me puxa. Era uma amiga, aquela que há uns tempos me chamou estúpido por ter desistido no Douro Vinhateiro naquela altura fatídica da minha vida. E fomos na conversa durante largos quilómetros, apenas interrompidos pelo facto de ter conseguido ver o nosso grupo de caminhada e termos feito uma grande festa!   
Ora, esta amiga é uma máquina. Daquelas que em dia sim faz tempos do caraças, mas que hoje me disse que ia mais tranquila porque estava toda lixada (mensagem original censurada) por causa do treino muito rápido feito ontem. Disse-me que ia comigo porque eu ia a um ritmo agradável. 5:30m/km, boa? Pronto, já tenho companhia, mas se ela acelera dá cabo de mim. E como se pode ver, os quilómetros seguintes foram bem rápidos. Íamos na conversa, em amena cavaqueira sobre provas, dilemas entre trail e estrada, a menos motivação dela para a estrada por sentir que está a perder velocidade portanto com mais vontade de dar prioridade ao trail. E eu confirmei que sentia que estava com dificuldades em reduzir o tempo aos 10km, mas que quem me tira o alcatrão tira-me tudo, portanto tenho-me sentido mais confortável nas provas mais longas. E fomos, e fomos, conversámos imenso e os quilómetros iam passando. Novamente no ritmo ideal, até porque a estrada inclinava um pouco para cima. Apanhámos novamente a malta da caminhada, desviei-me da estrada para me fazer à foto em modo aviador, de braços bem abertos e sorriso rasgado. Ela percebeu que aqueles breves momentos significavam uma motivação extra e continuou sempre a puxar por mim para nos mantermos juntos. Ela disse que nunca fez uma Meia acima das duas horas, eu respondi que queria tentar fazer Évora abaixo das duas horas pela primeira vez. Vamos ajudar-nos mutuamente! Assim fomos até meio da prova. Nessa altura ela já ia uns metros à minha frente e dois atletas tinham metido conversa com ela sobretudo quando ela gritou o meu nome e eu prontamente respondi a confirmar que estava perto. Ainda tentei puxar por mim, mas aos chegar ao abastecimento dos 10km ela já estava a ficar mais longe e ir atrás dela era escusado. Máquina é máquina! Via novamente no final onde demos um enorme abraço e ela me pediu desculpa por não ter esperado por mim. Qual desculpa, qual quê? Obrigado e mantém-te sempre assim, porque quando se tem bom coração a cor da camisola que representamos é irrelevante.
Parei uns segundos no abastecimento para beber isotónico. Tenho que tentar parar com esta mania, mas beber naqueles copos em andamento é virtualmente impossível
 

Baterias carregadas e um tempo de uma hora certinha aos 11 quilómetros, altura em que tomei um gel. Só preciso de fazer uma hora nos restantes 10km e a coisa fica feita. Tentei manter o ritmo anterior e até acelerei um pouco quando encontrei um atleta de Leião e meti conversa com ele. Estiquei-me um bocado e tive que abrandar, mas foi pena porque ir a falar com alguém estava a fazer-me bem. Nesta zona mais afastada da cidade sabia que íamos fazer uma espécie de quadrado. Mais um menos dois quilómetros e viramos à esquerda, a mesma coisa a seguir e novamente e repete outra vez até fechar os quatro lados, pelo que o meu objectivo era sempre chegar à próxima viragem à esquerda. Infelizmente tive mesmo que voltar a parar no abastecimento seguinte, aos 15km. Foi aqui que comecei a sentir o peso e o desconforto de não ter feito tudo o que devia no wc antes da prova.
Respirei fundo e tentei abstrair-me disso. Ia mais devagar que antes, mas mesmo assim a um ritmo controlado que me permitia gerir o tempo que tinha ganho até ali. Infelizmente não foi possível continuar assim até final. O quilómetro 19, onde havia um último abastecimento, foi mais complicado e tive mesmo que caminhar um pouco. Foi aqui que o objectivo de tempo para a prova se esfumou. Ainda tentei ganhar um ânimo final ao reentrar em Évora, mas aí foi o empedrado que me tirou as esperanças finais. Caraças que ao fim de quatro anos aquilo continua a custar. Nesta fase já me tinha cruzado algumas vezes com um atleta em que ou passava ele ou passava eu e antes da placa dos 20km ele pergunta-me se agora vamos a correr até ao fim. Disse-lhe que sim, só que não. Paciência, as pernas já não davam para muito mais. 

Engane-se quem pensa que eu estava desanimado com este rombo final no ritmo. Ainda deu para uma animada troca de palavras com um elemento da organização e para lhe dizer que a subida até ao Giraldo continua demasiado íngreme e com muito empedrado. Ficou a promessa de resolverem a situação para o ano. Deixe estar, se não tratarem disso eu venho cá na mesma comer sopa de cação.

E pronto, agora é só virar à esquerda para aqueles 500 metros finais até à meta que parecem ter 10 quilómetros. Um dos meus colegas veio ter comigo para um apoio final. O resto da malta está ali em cima, à direita. E a corda? Onde é que está a corda para me puxar? De alguma forma lá consegui subir aquela montanha até passar a meta com um ar de pura alegria. Nem percebi bem o tempo, mas pouco interessava. Vamos é almoçar, pá!

Fotos finais, abraços finais e muitos sorrisos. Mais uma prova feita e as dificuldades dos últimos quilómetros já estavam esquecidas. Enquanto descíamos para o estacionamento já ia todo contente a dar força a quem ainda acabava a prova. O sorriso transformou-se em ligeira preocupação quando me de uma valente câimbra quando estava a alongar. Nunca me tinha acontecido de forma tão intensa! Felizmente quem tem uma enfermeira como a nossa, tem tudo. E ela tinha uma ampola de magnésio que, por acaso, não tinha tomado antes da prova e deu-me para ajudar. E ajudou.
 
Vamos almoçar! E fomos, apesar da dificuldade em dar com o caminho certo tal era a quantidade de estradas ainda cortadas. O almoço demorou praticamente tanto tempo como a minha prova e devo ter recuperado todas as calorias que perdi. Oh meus amigos, come-se tão bem no Alentejo. E bebe-se igualmente bem. Deve haver por aí fotos, algumas até passíveis de causar algum embaraço. Felizmente eu faço sempre questão de reservar o lugar do pendura nos regressos pós-prova.

Não fiz abaixo das duas horas. Não melhorei o meu tempo em Évora por 21 segundos.
Chateado? Nada disso! Corri, comi e diverti-me. Enquanto for assim está tudo bem.
Venha a próxima, a Meia Maratona dos Descobrimentos.
 
 
Prova nº 97 - Meia Maratona de Évora 2018 - 21km - 02:02:31

5 comentários:

  1. Muitos parabéns por mais uma Meia e venha os Descobrimentos já a seguir :)
    Sim... É pena que organizações tão boas repitam insistentemente essa farsa de exagerar os números para patrocinador ver...
    Quanto a trocar dorsais, a questão que levantas é apenas uma, sendo a mais grave se suceder um acidente o seguro não cobrir.
    A 100 aproxima-se a passos largos. Já sabes onde será?
    Um abraço e força para domingo

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    1. Obrigado! Ainda não vi bem os horários, mas assim que terminar vou agarrar-me ao telemóvel para saber como te está a correr a ti.
      É mesmo pena, é preferível deixar as fotos aéreas falarem por si e mostrar o mar de gente que estava sem dizer números. Acabei por sentir alguma vergonha alheia.
      Há uns tempos atrás já tínhamos falado aqui sobre questões de seguro nas trocas de dorsais, agora lembrei-me deste detalhe que para quem gosta de estatística acaba por fazer diferença.
      Sei onde é a 100, só não sei onde é a 99: Alcanena ou Cruz Quebrada.
      Um abraço e igualmente!

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    2. Mau lá tás tu!!! Vais a Alcanena, não tens desculpa!!

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  2. 20 segundos?? Bolas, realmente uma corda tinha dado muito jeito, aquela subida final é horrível. Mesmo assim fizeste um excelente tempo.
    Mas não aprendeste nada comigo?? Tão importante como estudar o percurso é localizar os WCs!! IMPORTANTÍSSIMO!!!
    Ohh pahhh gosto tanto de ir a Évora, fiquei cheia de inveja das vossas fotos... E fiquei com contas para ajustar com essa prova no ano passado!! Em 2019 não posso falhar.
    **

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    1. 21, na verdade. Há dois anos fiz 2:02:10. Eu ainda fui a imitar que estava a puxar uma corda imaginária. Obrigado!
      Aprendi sim, mas o organismo estava bloqueado, não valia a pena para a meio da prova para isso. :P
      Também gosto muito, apesar de sentir algum cansaço pela repetição de algumas provas. Mas como disse a certa altura à minha companheira de percurso, basta algum companheiro de equipa dizer que quer ir à prova X para irmos logo todos e não deixarmos ninguém sozinho.
      Se lá voltar em 2019 se calhar faço os 10km. :) ***

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